segunda-feira, 16 de agosto de 2010

.eu sabia.

jú mancin

d°_° b no surprises, radiohead

a gente sabe. a gente sempre sabe…

o que nos mata e o que nos fortalece.

eu sabia que ficaria em silêncio de novo, que aquela estrela me calaria. eu sabia do medo que, ora ou outra eu ia sentir e que numa dessas madrugadas e meia, eu choraria em segredo a solidão do mundo, escondendo os olhos no travesseiro. sabia que flutuaria numa manhã ensolarada e sorriria, agradecendo ao cosmos por mais um dessas brincadeiras que acabam se tatuando em mim. sabia da ânsia que ia sentir por uma dose a mais e da amnésia que apagaria meus piores pesadelos. eu sabia que mais uma vez, não seria pouco isso tudo que berra aqui dentro e sabia que seria difícil dissimular. sabia de tudo quando me sentei na pontinha do penhasco para ver a vista lá embaixo. sabia até que me encantaria a queda, assim como eu sabia que minhas asas não seriam suficientes e que meu pára-quedas poderia não funcionar, assim, tão bem. e sabia que aquilo tudo, uma hora seria nada. [porque esse é assim que as coisas são]. eu sabia até que hesitaria por medo da queda e me trairia logo em seguida, porque também sabia que o medo não valia a pena. a verdade é que eu sabia e mesmo assim sorri pro destino e deixei o barco correr…

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

...

Lu Minami

Ouvindo: Wild is the Wind (Nina Simone)


Eu sabia, estava entrando na fase. Os sinais começavam a ficar claros e as pessoas amáveis ao meu redor se preocupavam e me cercavam junto com seus cônjuges também amáveis que ligavam e queriam saber mais. “Tem algo errado com ela, ela está triste, o que ela tem? Será que é de novo o cara? Odeio quando ela começa a falar e perde o olhar no teto. Definitivamente tem algo errado”. Eu sabia da fase porque estava começando a olhar com aflição os meus pés e pensava nas pequenas rugas que começavam a aparecer. Eu sempre penso que rugas nos pés só valem se eles estiverem velhos de tanto andar. Eu andei bem pouco nessa vida. Eu sabia porque algo começava a se alastrar em mim como uma idéia genial que ninguém nunca teve. A barriga contorcia e tinha espasmos gelados junto com a minha neurose e minha timidez, tudo misturado com o calor que invadia minha garganta. Eu sabia que estava entrando na fase porque minha voz estava falhando, como quem parece ter gritado a noite inteira ou então como quem permanece dias e semanas em silencio. Eu sabia porque minha boca estava reta, numa linha fina e seca e eu só conseguia passar a língua sobre os lábios para fazer rachar e sangrar. Eu sabia porque começava a esquecer nomes de coisas e pessoas porque elas iniciavam o processo irremediável do tempo, onde deixam de ser realidades para se tornarem memórias. Eu sabia porque permanecia em silêncio nos meus diálogos internos, como quem pondera e avalia, pesa e pensa a respeito. Eu sabia porque as cores começavam a adquirir tons estranhos e confusos e as pessoas começavam a ficar pálidas, como os vídeos da infância. Eu sabia porque meus cotovelos estavam duros demais, como quem aprende um só golpe de defesa durante toda a vida. Eu sabia porque estava ouvindo muito mais jazz do que antes na tentativa de ajustar meu ritmo e torná-lo universal. Eu sabia porque pensava em tatuagens e colorações de cabelo para fugir do reflexo antigo de mim mesma. Eu sabia que estava entrando na fase porque o encanto acabou e ninguém conseguia me manter por perto por muito tempo. Eu sabia porque quando andava, me perdia. Eu sabia porque quando dormia, sonhava longe. Eu sabia porque a graça não estava mais comigo; sem graça, sem amor, sem paixão e sem desejo. Eu sabia porque meus olhos estavam desconfiados no espelho. Eu sabia porque o peito calava e as pernas tremiam. Eu sabia porque minhas mãos me encaravam o tempo inteiro e me cobravam uma atitude, um gesto. Eu sabia.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

.embriagai-vos. [dandys do mundo, uni-vos]

ju mancin

d °_° b so what, miles davis

É necessário estar sempre bêbado.
Tudo se reduz a isso; eis o único problema.
Para não sentirdes o horrível fardo do Tempo, que vos abate e vos faz pender para a terra, é preciso que vos embriagueis sem cessar.
Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha.
Contanto que vos embriagueis.
E, se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do vosso quarto, despertardes, com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, perguntai ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são;
e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder:
É hora de se embriagar!
Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos;
embriagai-vos sem tréguas!
De vinho, de poesia ou de virtude, a vossa escolha.

C. Baudelaire

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